A problemática da violência contra as mulheres revela que por detrás de muitas condutas violentas encontram-se representações sociais do "ser masculino" e do "ser feminino", interiorizadas tanto em homens como em mulheres: e que essas representações fazem com que o contexto da autoria saia da mera esfera dos autores materiais da agressão para o das formas como o agressor e a vítima se representam socialmente entre si e na sua relação mútua.
A violência nas relações amorosas expressa dinâmicas de afecto/poder, nas quais estão presentes relações de subordinação e dominação (por vezes consentidas), sendo o ritual das agressões iniciado, muitas vezes, no namoro, que corresponde à fase da escolha do(a)parceiro(a) e também ao momento em que se iniciam as primeiras negociações e padrões de relacionamento. E, que em alguns casos, apesar da gravidade das agressões, vários mecanismos psicológicos, sociais e culturais ajudam a prolongar a situação mesmo depois de casadas.Num estudo recente, sobre as situações de violência extrema que dão origem a processos nos Institutos de Medicina Legal (IMLs) e futura participação judicial, a maioria de casos observados em Coimbra e no Porto referem-se à violência física (83%). Apesar da gravidade dos actos, os resultados mostram também que, para a maioria destas mulheres há uma trajectória de violência que vem detrás: em 84% dos casos é anterior ao último ano e em 36.7% das situações essa violência prolonga-se mesmo por um período dupeiror a dez anos. Igualmente é de assinalar a percentagem considerável de mulheres que refere ter sofrido vários tipos de violência (nomeadamente, física e psicológica), o que vem reforçar a hipótese de que em alguns casos a violência tende a ocorrer em "cachos", no sentido em que os actos estão intrincados entre si e vão ocorrendo de uma forma articulada e em cascata, particularmente quando há uma trajectória de violência. Importa, então, conhecer o que prende estas mulheres a relações violentas, quando se encontram em contextos sociais que a tal não são obrigadas por constrangimentos institucionais, ou sociais deles derivados.
Formulação do Problema
De certo modo, poder-se-á dizer que a violência que afecta as mulheres é também socialmente construí da, quer pelos contextos socioculturais mais próximos que lhe estão associados na esfera das interacções quotidianas da vida privada e social, quer pelos contextos das várias camadas da sociedade envolvente, que, pela estigmatização dos géneros e dos papéis sociais institucionalizados, criam condições para que ela ocorra com diferente intensidade e frequência.
Quanto ao perfil social dos agressores, e tendo por referência os estudos citados, verificase que na relação de parentesco com as vítimas predominam os maridos (49,6% IMLs; 40% Custos Sociais), sendo que, nos resultados do estudo do IML de Coimbra 12,2% das mulheres vítimas têm como agressores os namorados.Outro aspecto importante que ajuda a compreender o contexto social e cultural que está subjacente à autoria da violência diz respeito às causas apontadas para a agressão. No caso da violência extrema, detectada nos IMLs, o ciúme é a mais referida (44,4%, sendo particularmente expressiva em Coimbra com 54,6%). O sentimento de ciúme, enquanto justificação da agressão, surge estreitamente relacionado com a construção social dos géneros, legitimando implicitamente (ou atenuando) a conduta de quem agride e, em alguns casos, servindo de prova da existência de afecto.
Objectivo geral
Interferir na Família: Expectativas de Reacção da Vitima de violência conjugal e da comunidade. A interferência na família por parte de entidades externas pode configurar a intervenção informal (por exemplo por parte de outros familiares ou dos vizinhos) ou formal e institucionalizada (por exemplo por parte das agências sociais e/ ou judiciais).
Objectivos específicos
Partindo de uma análise cultural do problema da violência no seio da família, pressupor que a interferência formal e institucionalizada é condicionada pelas crenças, valores e práticas sociais que consubstanciam uma percepção da família que é partilhada pela comunidade em determinado momento histórico (percepção social), definindo, de forma tácita, as normas, os limites e as expectativas em relação a essa mesma interferência. Quando os maus tratos conjugais configuram um crime público importa conhecer a percepção da comunidade em relação às expectativas de comportamento de uma mulher vitima de violência conjugal, às expectativas em relação às medidas a aplicar ao agressor e à motivação para intervir numa situação de maus tratos conjugais, alheia ao próprio, sugerindo a expectativa de comportamento por parte da comunidade em geral, no que concerne às situações de maus tratos conjugais.
Conhecer, Capacitar Prevenir; uma proposta interdisciplinar de enfrentamento da violência doméstica contra mulheres,crianças e adolescentes.
Conhecer, Capacitar Prevenir; uma proposta interdisciplinar de enfrentamento da violência doméstica contra mulheres,crianças e adolescentes.
Metodologia
A violência, em suas diferentes expressões, tem sido um dos fenômenos que mais preocupam a sociedade brasileira. Muito se tem discutido sobre formas para o seu enfrentamento, porém, pouco se fala em termos de prevenção. Com o objetivo de sensibilizar os sujeitos envolvidos nessa temática, uma equipe interdisciplinar busca resgatar / recriar formas democráticas de relacionamento e educação, que privilegiam o respeito, o diálogo, o afeto, respaldados nos princípios da Cultura da Paz (UNESCO). Propõe-se também a rejeição ao "pacto do silêncio", do qual participam vítimas, familiares e, infelizmente muitos profissionais que, de alguma forma, mantêm relações sociais com estas famílias. Incentivar a notificação dos casos de violência aos órgãos de defesa dos direitos da criança, entendendo que a omissão da escola contribui para que o fenômeno da violência doméstica contra crianças e adolescentes se reproduza socialmente.
Caracterização
As perspectivas tradicionais sobre a violência conjugal têm-se baseado na assunção empírica de que os homens são provavelmente mais capazes de se envolver em actividades violentas nas relações conjugais, sendo o próprio termo "violência conjugal" usado como eufemismo de "mulheres agredidas".Não se pretende diminuir a importância deste problema cada vez mais reconhecido e investigado. Também não é objectivo explorar a ideia, sugerida por alguns autores, de que as agressões cometidas pelas mulheres sobre os homens, no âmbito da vivência conjugal, constituem um fenómeno social comparável, na sua natureza e magnitude, ao das mulheres mal tratadas. Se alguns autores o afirmam, é importante notar que outros oferecem argumentos igualmente válidos que contribuem para desmistificar tal noção.Contudo, e independentemente da discussão em torno da questão da simetria no uso da violência conjugal, sabe-se que também as mulheres se podem constituir como agressoras. Havendo certamente diferenças entre as experiências de mulheres e de homens abusados, ambos os lados da questão deverão ser aceites como avenidas viáveis de investigação abrindo caminho para que o problema da violência conjugal possa ser compreendido de forma mais plena. Da comparação entre representações masculinas e representações femininas pode resultar uma visão mais holística sobre a natureza, a dinâmica, as formas e consequências da violência conjugal. A questão não passa por negar a existência, de facto, de homens violentados, mas pela necessidade de compreender as condições em que a violência é exercida, o que motiva as mulheres a fazerem-no (se se trata de uma "violência defensiva" e/ou de uma "violência ofensiva"), o contexto em que ela ocorre, as consequências que daí podem advir e as interpretações que tanto homens como mulheres elaboram para explicar o fenómeno tendo, portanto, presente vários indicadores que poderão ajudar a enquadrar a questão da simetria/assimetria da violência conjugal. Interessante será perceber que consoante as metodologias e instrumentos de investigação utilizados os argumentos sobre a simetria ou assimetria na violência conjugal pendem ora num ora no outro sentido. Daí se concluir a necessidade de se estabelecerem, nas investigações em curso, não só critérios rigorosos de análise como também a afirmação da centralidade de determinadas distinções, designadamente, no que respeita aos tipos de agressões e de agressores e também aos tipos de relacionamentos e diferenças de género, evitando deste modo generalizações descuidadas de um contexto para outro.
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